A mais longa viagem, disse alguém um dia, é a que vai da cabeça ao coração.
O Niall tem um amigo sacerdote, na Irlanda, que lhe disse: “Cruzei-me mais vezes com ateus durante o meu curso bíblico do que no resto da minha vida.” Conhecer a Bíblia não é um passaporte para a fé. Eu nunca fiz nenhum curso bíblico (infelizmente), mas já escutei trechos de vários, a viva voz, aqui no nosso país. Se alguns me encantaram, outros eram, sem dúvida alguma, um incentivo ao ateísmo ou, pelo menos, um incentivo à negação das verdades católicas tal como as conhecemos. Cursos bíblicos que afirmam, por exemplo, que Maria não concebeu virginalmente, porque a sua virgindade era tão meramente de coração; ou que as curas dos leprosos e dos paralíticos são simples relatos simbólicos, não são cursos destinados a formar crentes católicos, parece-me a mim óbvio!
Depois de um curso deste género, acontece com frequência aos novos “doutores” da Bíblia estar na missa e escutar uma homilia sobre, imaginemos, a maravilha do nascimento de Jesus na gruta de Belém, e darem consigo a pensar: “Eu sei muito mais do que o sacerdote sobre a verdade dos factos, pois eu sei, e ele não, que tudo isto é simbólico.” De repente, quem frequentou um curso assim descobre-se mais sábio que todos os santos ao longo de dois mil anos de História, e sorri complacentemente perante tanta ignorância. Tal soberba é o princípio da falta de fé. Pois quem sou eu, quem é cada um de nós, para achar que sabe mais do que os outros, e especialmente que sabe mais do que a Igreja? Onde está a verdadeira sabedoria? Também os demónios sabiam quem Jesus era. Segundo o evangelho de Marcos, os demónios estavam mais informados sobre a Bíblia do que os homens:
Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para nos destruir? Sei quem tu és, o Santo e Deus! (Mc 1, 24)
E os fariseus e os escribas eram mais versados nas Escrituras que o povo humilde que seguia Jesus…
Todos nós, batizados, recebemos gratuitamente o dom da fé no nosso batismo. Deus plantou em nós uma semente minúscula e pediu aos nossos pais e padrinhos que a regassem com jeitinho para ela dar fruto. Porque não houve quem regasse, a semente de muitos cristãos secou e quase morreu. Mas continua lá, e Deus, que fez ressuscitar os mortos, tem poder suficiente para a insuflar novamente com o sopro da vida. A fé é sempre, sempre um dom.
Conheço pessoas que chegaram à fé pela razão. Discutindo, discordando, questionando, estudando, foram encontrando as razões para todos os artigos do nosso Credo. E depois de encontrar essas razões, deixaram o vento divino soprar sobre a sementinha adormecida e acreditaram.
Porque viste, acreditaste. (Jo 20, 29)
O meu percurso e o de tantos outros católicos foi precisamente o oposto: desde pequenina que me acostumei a aceitar o que a Igreja me propunha, sem questionar. É para ir à missa aos domingos? É para rezar o Terço todos os dias? É para ajoelhar na consagração? É para ser virgem até casar? Não devemos usar contracetivos? Devemos batizar as crianças logo que nascem? Vamos a isso!
Felizes os que acreditam sem terem visto. (Jo 20, 29)
Depois, e porque (como acho que já todos perceberam) adoro saber cada vez mais, conhecer cada vez melhor a Palavra de Deus e a Palavra da Igreja, não parei de ler, escutar, analisar, meditar, encontrar sentido através do estudo para aquilo em que já acreditava pela fé.
Um estudo profundo sobre a Eucaristia faz com que ela passe a fazer mais sentido para nós? Sim. Um estudo profundo sobre a Eucaristia faz com que deixemos de faltar à missa dominical? Não. Olhemos para os nossos irmãos mártires deste tempo, aqueles nigerianos mortos à saída da missa, aqueles iraquianos celebrando às escondidas durante a noite. O que há de diferente entre eles e nós? Serão as suas catequeses mais profundas que as nossas? Serão aqueles cristãos, alguns certamente analfabetos, mais versados em estudos bíblicos ou dogmáticos que nós? Conhecemos a resposta. A única coisa que difere é a fé. Uns acreditam, outros não.
Eu posso escrever vinte posts sobre o valor da Eucaristia. Quem tiver fé encontrará neles uma fonte de crescimento e aprofundamento muito valiosa. Quem não tiver fé encontrará neles matéria para mais uma discussão intelectual e terá perdido o seu tempo a ler.
Ou talvez não. Talvez o seu caminho comece, como sugeri acima, na razão, e daí parta para o coração. É uma viagem longa, a mais longa que existe. Sei de alguns leitores e algumas leitoras que já a iniciaram… E afinal, qualquer viagem, mesmo a mais longa, começa com um só passo.
Olá Teresa!
Obrigada por mais uma boa reflexão!
Não vindo directamente a propósito, que livros recomenda acerca das Aparições de Nossa Senhora em Fátima?
No ano do centenário publicou-se tanta coisa, mas confesso que suspeito um pouco daquelas edições que vêm com o JN, etc..
Cumprimentos a todos!
Olá Célia! Acho que faz bem em suspeitar de tudo o que foi sendo escrito neste ano de centenário, pois saiu muita coisa triste… Não a posso ajudar, porque não comprei nada este ano sobre Fátima (para adultos) a não ser o livro que as Irmãs Carmelitas escreveram sobre Lúcia: Um Caminho sob o olhar de Maria – e que é magnífico, e os escritos de Lúcia – as várias memórias, Apelos da Mensagem de Fátima e um pequeno texto inacabado, Como Vejo a Mensagem. Nunca li nada sobre Fátima que não viesse desta fonte, a mais cristalina… Bj