“Há na Igreja muitos movimentos que se ocupam da família”, alguém dizia durante o retiro Famílias de Caná. “Qual é então a novidade do nosso movimento?” Pensávamos no Opus Dei, nas famílias de Schonstatt, nas Famílias Novas dos Focolares, nas famílias do Coração Imaculado de Maria, nas Famílias de Nazaré, nas Famílias Hospitaleiras, nas famílias Neocatecumenais, nas famílias do Comunhão e Libertação, nas Novas Comunidades como a Comunidade Emanuel ou a Comunidade Canção Nova, nos Cursilhos, e em muitos outros movimentos laicais que, graças a Deus, inundam a nossa vida de fé. “Qual a novidade que trazemos à Igreja, se é que trazemos alguma? Há tantos movimentos com ramos específicos para as famílias!”
Foi o nosso bispo de Aveiro, D. António Moiteiro, quem respondeu de imediato: “Sim, há na Igreja muitos ramos dedicados às famílias; mas as Famílias de Caná não são um ramo: elas são o tronco.”
Esta afirmação do nosso bispo ajudou-nos a organizar um bocadinho melhor as nossas ideias. De facto, há na Igreja muitos movimentos que se ocupam das famílias; mas nenhum deles – nem sequer os vários movimentos de casais – nasceu a partir de uma família. Todos têm a sua origem em sacerdotes ou em leigos celibatários que, pela santidade da sua vida, encontraram legitimidade diante de Deus e dos homens. O padre Caffarel, Chiara Lubich, Monsenhor Brás, Dom Giussani, Carmen e Kiko, S. Josemaria Escrivá, e muitos outros, são modelos para todos nós na procura e na vivência da vontade de Deus, servindo as famílias do mundo inteiro. Mas nenhum deles constituiu uma família fundada no sacramento do matrimónio.
Não é fácil, para nós Família Power, para as famílias que querem integrar o movimento, ou para os sacerdotes que encontram as Famílias de Caná nas suas paróquias, aceitar esta novidade divina nas nossas vidas. Ao longo de vinte séculos, habituámo-nos a ver a família como “vocação de segunda”, como “plano B” da santidade. Os pais de Santa Teresinha, recentemente canonizados, aspiraram à vida consagrada e celibatária antes de se apaixonarem, e assim aconteceu com a grande maioria (não todos) dos santos da Igreja que foram casados: se não aspiraram a consagrar-se antes, fizeram-no depois de enviuvar.
Estamos todos acostumados a ser conduzidos no caminho da santidade por sacerdotes, por religiosos ou por leigos celibatários, que vivem a virgindade como sinal da proximidade com Deus. E eis que agora o Senhor nos chama a nós, simples família cristã, sem estudos teológicos especiais, sem votos professados, para abrir caminho a uma multidão de famílias… Que legitimidade temos nós? Em que estaria o Senhor a pensar, quando Se lembrou de nos chamar para esta tarefa, tão difícil quanto bela? Abro a Exortação Apostólica do nosso querido Papa Francisco, Amoris Laetitia, e leio:
A família é um sinal cristológico, porque mostra a proximidade de Deus que compartilha a vida do ser humano unindo-Se-lhe na encarnação, na cruz e na ressurreição: cada cônjuge torna-se “uma só carne” com o outro e oferece-se a si mesmo para partilhar tudo com ele até ao fim. Enquanto a virgindade é um sinal “escatológico” de Cristo ressuscitado, o matrimónio é um sinal “histórico” para nós que caminhamos na Terra, um sinal de Cristo terreno que aceitou unir-Se a nós e Se deu até ao derramamento do seu sangue. A virgindade e o matrimónio são – e devem ser – modalidades diferentes de amar…” (nº 161)
O sacerdócio, a vida religiosa e a vida familiar são três formas diferentes de viver o mesmo amor por Jesus. Nenhuma delas é superior à outra, e em todas podemos aspirar aos mais altos cumes da santidade e da união com Deus. Escolher um destes caminhos na vida não é uma questão de maior ou menor amor ao Senhor, mas de vocação.
Não há dúvida: nós, famílias cristãs, estamos a viver tempos novos, e somos chamadas a ser sinal histórico, cristológico, do amor de Deus encarnado. E é em família que cada um de nós quer ser santo.
Que consequências práticas tem esta novidade na Igreja? Muitas! E também no retiro nos demos conta delas. Fazer um compromisso individual num movimento ou numa ordem é difícil; mais difícil é fazer esse compromisso em família… Sobre isso falaremos num próximo artigo!
Bem hajam! Que o Espírito Santo vos e nos continue a guiar!
Rita