Em Caná da Galileia...


Coração

Ontem à noite, quando me ia deitar, deparei-me com estes dois pedaços de papel em cima da minha cama:

Aproximei-me e li as “instruções” do papel que estava no meu lado da cama:

Junta isto com o dada (papá). Lúcia. Inventei!

E no outro lado da cama:

Junta isto com a mamã. Lúcia. Inventei!

Sorri. A Lúcia, com nove anos, e como é tradição cá em casa, adora fazer origamis. Quis ter a certeza de que nós nos iríamos orgulhar, sabendo que este fora inventado por ela. Cumprindo as instruções, juntei os dois origamis:

Chamei então o Niall, e os dois contemplámos, sorrindo, o coração cor-de-rosa que a Lúcia criara. Depois conversámos um bocadinho sobre a segurança que a Lúcia e os seus irmãos experimentam, crescendo com um pai e uma mãe que se amam em absoluto. Sabemos que o primeiro dever dos pais para com os seus filhos é amarem-se um ao outro. Ousada, esta afirmação?

É um fenómeno estranho, este: de todas as pessoas da família, a única que podemos escolher é o nosso cônjuge. Ninguém, de facto, pode escolher os pais, os filhos, os avós, os netos, os irmãos, os tios, os primos, os sogros, as noras ou os genros. Mas todos podem – no nosso mundo ocidental – escolher o marido ou a mulher. Por que será que tantos, então, acham ter errado na única escolha que lhes foi permitido fazer? Com um número tão elevado de divórcios, estamos a dar pontos àqueles que defendem os casamentos arranjados…

E se decidíssemos olhar para o compromisso que temos com o nosso cônjuge da mesma forma que olhamos para o compromisso que temos com qualquer outro membro da família? Ninguém, no seu perfeito juízo e com um sistema moral bem formado, irá querer trocar de pai ou de mãe, ou mandar o filho ou a filha embora porque não correspondem ao nosso ideal de filhos. É uma hipótese que não se coloca, apesar de todos os problemas que surgem nas relações familiares. E porque não se coloca, colocam-se outras: pedidos de ajuda para resolver conflitos, tentativas de mediação, oração, mais compreensão, mais paciência, mais carinho. Por que não tratamos da relação com o cônjuge da mesma forma (atenção que não me refiro a situações criminosas, como as que envolvem violência, mas à grande maioria das situações que conduzem a divórcios nos dias de hoje)? Se partirmos do princípio de que não podemos trocar o nosso cônjuge, vamos encontrar, juntos, formas de superação de qualquer tipo de conflito.

O Niall faz parte de mim, e eu faço parte do Niall. Não consigo imaginar a minha vida com outra pessoa, nem ele o consegue fazer. Não conseguimos ficar zangados mais do que alguns minutos (excecionalmente, algumas horas) um com o outro, seria demasiado doloroso. Não conseguimos passar um dia sem nos abraçarmos e acarinharmos, e geralmente, à hora do almoço, precisamos de falar ao telefone para saber como está a correr o dia. Somos um casal. E isso significa que cada um de nós tem apenas, no peito, metade de um coração. Juntos, então sim, o coração bate seguro no Corpo saudável que é a nossa família.

Bem-hajas, querida Lúcia!

6 Comments

  1. Sofia Portela

    Estava outro dia, na minha hora de almoço, com uns colegas meus, e começou a falar-se dos prós e contras de se casar. Todos chegaram à conclusão que “viver junto” era melhor que casar. Arregalei os olhos e, não querendo “acusar” ninguém, pois cada um é livre de dizer o que pensa, disse “Isso é porque as pessoas hoje não querem ter compromissos. Fogem disso sempre que podem”, ao que me responderam, muito naturalmente, “Ah, não é isso! Estando casada também podes sempre divorciar-te!”. Ou seja, o divórcio é o escape garantido para o compromisso?! Acabei por não responder mais nada, tão atónita que estava.

    • Sabes Sofia eu casei nova para a época, com 22 anos e no 3º ano de curso, muitas pessoas não acreditavam que nos aguentaríamos casados mais do que meia dúzia de meses, muita gente me disse para “ter cuidado”, mas no nosso coração só o casamento fazia sentido, construímos a nossa casa aos fins de semana durante os últimos dois anos dos cinco de namoro, assim que vimos a nossa casa quase pronta marcámos a data de forma a não interferir com as frequências da faculdade e casámos. Na manhã do primeiro dia na nossa nova casa depois do casamento sentimo-nos tão bem, tão felizes, com tanta esperança no futuro! Estamos casados quase há 15 anos, a família cresceu e nunca, nunca me arrependi da decisão que tomámos!

  2. Este post é tão, mas tão para mim! Obrigada à Sagrada Família que, mais uma vez, te inspirou para escrever esta linda reflexão sobre o casal e o casamento.

  3. Muitas vezes é perante as maiores dificuldades que tenho dado conta da grande bênção que é ter alguém do meu lado (não é uma sorte como alguns gostam de dizer). Tenho acompanhado alguns divórcios e sofro por ver que na grande maioria dos casos não basta um querer, não basta um amar, são precisos dois… para quem acredita no matrimónio ver o casamento destruído deve ser terrível, uma dor enorme.
    É preciso rezarmos muito pelos casais, pelas famílias!

  4. Só posso agradecer, Teresa, por escrever sobre matrimónio….é tão difícil hoje em dia ter referências…. é tão difícil por vezes, dar testemunho de matrimónio..

    Célia

  5. Ver famílias felizes ajuda a acreditar no amor 😀 Há amores que não chegam a ser amores, são meras ilusões, paixões. Qdo é pouco construído e o coração pede mais e pode dar mais sabe a pouco. A vossa vivência em família ultrapassa-me. Conseguiram algo mto valioso à custa de mta entrega e sim, muito amor. Mas sinceramente parece-me que por viverem essa dimensão aumentam os padrões de exigência à vossa volta, o que é normal. Afinal o amor devia de ser mais exigente, não somos descartáveis. Mas na prática é difícil encontrar a peça certa, é difícil expressar sentimentos e conhecermo-nos o suficiente para saber entendermo-nos a nós e aos outros. No autoconhecimento e em desenvolver ferramentas para nos relacionarmos melhor, aí sim acho que devemos de ser mais exigentes. senão de que vale a pena exigir relações sólidas se mesmo depois de partilhar mto com alguém continuamos a ser desconhecidos? Acredito na força da fé para unir uma relação mas não chega. Precisamos de nos conhecer melhor uns aos outros. (não é nenhuma acusação, imagino que tb invistam nessa parte) 🙂 um beijinho

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