Em Caná da Galileia...


De pijama, no sofá – e um teste escrito

Aula de Inglês, oitavo ano. O tema é simples: “Free time activities” (atividades de tempos livres). Aprendemos vocabulário, lemos alguns textos e, para ilustrar as palavras novas, projeto algumas fotos da minha família a patinar no paredão da Praia da Barra, a fazer uma fogueira no carrinho-de-mão na noite de Holywins, a brincar no chão da sala, a jogar às cartas, a jogar xadrez, a ler. Fotos que tenho partilhado aqui no site com fartura. Os alunos observam, encantados:

“Deve ser giro ter uma família assim!”

“Como é que fazem tanta coisa juntos?”

Depois começam os comentários a que, infelizmente, já me acostumei:

“Na minha casa, o fim-de-semana é de pijama, no sofá.”

“Ao fim-de-semana não faço nada. Mesmo nada. Nada, de nada…”

“Em casa, digo três frases: Bom dia! Boa tarde! O que é o comer?” (Sim, assim mesmo.)

Desligo o projetor e inicio um diálogo:

“Pedro, porque é que hoje à noite não pegas num tabuleiro de xadrez e levas ao teu pai, para jogarem juntos?”

“Oh, stora! Ele mandava-me passear. Dizia logo: ‘vai ter com a tua irmã!’ O meu pai não tem paciência para essas coisas! Ele gosta de chegar a casa, calçar as pantufas e sentar-se no sofá, a ver televisão…”

E lá do fundo da sala, uma menina pergunta:

“Como é que a professora tem paciência? A minha mãe disse-me ontem: coitadinha da tua professora, com sete! Vocês são duas e já me dão cabo da cabeça!”

E mais não vos conto…

Chegámos a isto: amar é uma questão de paciência, e o tempo de família é o tempo do pijama e das pantufas. Aliás, a luta – muito justa – pelo direito de todas as crianças a uma família, ainda que de acolhimento, é expresso no “Dia Nacional do Pijama”…

Entregamos os estudos dos nossos filhos à escola e aos explicadores, entregamos a sua educação na fé à catequese, entregamos a sua necessidade de aventura aos escuteiros, clubes desportivos e centros de ATL. Para a família, sobram as pantufas – e o pijama.

Na passada sexta-feira, fui convidada pelo arciprestado de Ílhavo para falar da família enquanto caminho de santidade, que é o tema deste ano pastoral diocesano. A ideia era gerar diálogo e partilharmos pontos fortes e pontos fracos, alegrias e tristezas. Na igreja da Barra, esperava-me um salão cheio de famílias e dos seus párocos – para além de uma mesa recheada de bolos e aquecida com deliciosos chás. Que acolhimento fantástico!

Comecei o encontro por ouvir as questões que ali traziam as famílias. E depois, inspirada pelos diálogos que tenho tido nas minhas turmas do oitavo ano, decidi fazer eu própria algumas perguntas. Defeito de professora! Com a colaboração dos sacerdotes organizadores, distribuiu-se a todos os presentes papel e caneta. Prometi que não ia levar os “testes” para casa para corrigir, pois já tenho testes suficientes à espera do meu tempo. Assim, cada um podia ser o mais sincero possível consigo mesmo. E com silêncio total na sala, comecei o “teste”.

Foram onze perguntas. No final, houve quem tivesse respondido a três, a quatro, a cinco. Mas a grande maioria olhava, boquiaberta, para uma página (quase) em branco…

Aqui fica o mesmo questionário, para vos desafiar a projetar o novo ano litúrgico, que está quase, quase a começar! Tenho a certeza de que as Famílias de Caná e os leitores mais assíduos deste site irão ter uma ótima nota 🙂

QUESTIONÁRIO

(atenção: “em família” não é “no convívio da escola para pais e filhos”, “no retiro Famílias de Caná”, “no encontro das famílias da equipa de ginastas”. “Em família”, neste questionário, é em família apenas)

– Quando foi a última vez que, em família: fizemos um piquenique? Fizemos uma maluqueira, como passear à chuva, subir a uma árvore, acampar no jardim, rezar sob o céu estrelado, fazer uma fogueira…? Lemos o Evangelho? Fomos à missa? Jogámos jogos de tabuleiro, ou cartas, ou lego? Contámos uma história aos mais pequenos, ou vimos um filme com os mais velhos?

– Completem a frase: “Os Power/Silva/Santos/Marques (nome da família de cada um) são muito bons a…”

– Como celebramos o aniversário de batismo de cada membro da família?

– Como celebramos o aniversário de casamento?

– No último fim-de-semana, o que fizemos em conjunto, como família?

– Se, numa composição da escola, os nossos filhos tivessem de descrever a forma como os pais ocupam os seus tempos livres, o que escreveriam?

(Jogando às cartas para celebrar Cristo Rei)

Fica o desafio: peguem também aí em casa em papel e caneta (só na cabeça não vale!) e respondam com sinceridade.

Depois, aceitemos o desafio do Ensinamento Mensal: se há alguma coisa a mudar em minha casa antes do encontro definitivo com o Esposo – porque não mudo hoje mesmo?

Bom trabalho! 🙂

 

 

 

 

 

 

6 Comments

  1. Ui Teresa! Estes dias alguém me disse “nunca mais o mais pequeno tem a idade da irmã…para ir para os escuteiros. Epa, aquilo é porreiro… até os levam a passear a sítios que nós não temos tempo” 😱
    Bem…e eu que não posso falar muito que ainda ontem comentei “para mim hoje não é domingo…uff que cansaço” e ouvi “para mim também não, que quando cheguei fui à caixa do correio”.
    Esta vida, nesta corrida, passa e não damos conta do essencial!

  2. Teresa Eugenio

    Querida Teresa,

    Que bonito! Isso é o verdadeiro caminho para santidade em família.
    Vou aplicar o teu questionário cá em casa ao fim da tarde para fazermos os 5. Vamos ver as notas que saíram…
    Que bom começar o dia assim… Obrigada(Só uma nota, no sábado fomos ao 5 ao CNAL, na generalidade gostamos muito mas o texto da Linda Ghisoni foi exactamente de encontro ao que dizes e fazes! Espero que fique disponível pois é mais uma pérola!.)
    Bjs. Teresa

  3. Ah!!! Que maravilha de questionário! Temos de colocar isto numa folha PDF e fazer circular pelas redes sociais! A verdade é que dá trabalho e exige tempo, enquanto não percebemos que esse tempo é um investimento e não um desperdício nunca o faremos naturalmente…
    Ontem também jogámos às cartas ao serão 😉

  4. Reconheço que muitas vezes hoje em dia os horários de trabalho, tempos nas deslocações, etc. não favorecem muito o tempo em casa e em família… Mas ao constatarmos isso podemos optar por assumir que estamos perante um desafio e não uma fatalidade…
    Então se calhar o desafio é mesmo reflectir e pensar muito bem no que é realmente prioritário e repercutir isso nas nossas escolhas em cada momento que temos essa possibilidade.
    Este questionário proposto pela Teresa é um “abanão” que nos pode ajudar muito a fazer esta reflexão… não só para os momentos “mais curtos” em família durante a semana mas também nos “mais alongados” de fim de semana. Muito obrigada Teresa! Beijinhos!

  5. Paula Cristina Fernandes de Almeida

    Concordo que este questionário devia ser partilhado nas redes sociais.
    Trabalho numa creche/jardim-escola e digo sinceramente que cada vez estou mais convencida de que hoje em dia ter um filho é uma questão de vaidade, para publicar fotos, e receber muitos likes. SÓ!
    Se pedimos a colaboração para trabalhinhos ou “pesquisas” são muito raras as participações.
    Os pais ficam de férias e as crianças continuam a ir para a escolinha.
    De verão aparecem lá os pais a deixar as crianças e os pais com roupa de ir à praia e o fato de banho a ver-se por baixo da roupa….
    Tanto que havia para contar….
    Eu então acho sempre pouco o tempo que passo com as minhas filhas….
    Beijinhos

  6. Queridas mães, são os humanos a serem humanos… E quando as crianças eram essencialmente destinadas para trabalhar em tarefas básicas e repetitivas, tal como sucede ainda na India… e quando… ? A História está recoberta de atropelos ao Amor, por isso mesmo Jesus teve de morrer.
    Simplesmente morrer, para que nos salvássemos…
    Eu continuo a rezar pelas famílias, pela minha e por todas, porque é a primeira e melhor escola de Amor e agradeço o Dom da entrega de vida aos meus filhos.
    Porque é Dom concedido por Deus, que nós acolhemos… e

    E cá em casa comemos sempre com a televisão ligada, no telejornal, e conversamos ao mesmo tempo. Não faço piqueniques há anos, mas comemos amiúde no páteo!!!
    Não há receitas infalíveis, há caminhos possíveis e valores determinantes!

    beijinhos a todos!!!

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