Em Caná da Galileia...


Domingo de Páscoa

Reflexão semanal sobre as leituras do próximo domingo, publicada no jornal diocesano Correio do Vouga

ELE ESTÁ VIVO!

Madrugada do primeiro dia da semana. Este é também o primeiro dia da Nova Criação, mas isto Madalena ainda não sabe… Só sabe que não aguenta mais tempo sem visitar o túmulo do seu Senhor e amigo. Com a pressa do amor, Madalena corre ao sepulcro. Assustada, vê a pedra retirada e o sepulcro aberto. Que se passaria? Madalena não entra. Sabe bem a quem compete entrar e discernir, e por isso corre ao encontro de Simão Pedro, o escolhido do Senhor para Pedra da sua Igreja.

Pedro está com João, e os dois correm até ao sepulcro. João, jovem, corre mais depressa e chega primeiro. Não é assim ainda hoje? A Igreja jovem, a Igreja carismática chega primeiro quando o Espírito sopra novidade, mas é preciso esperar ali, com esperança e paciência, que Pedro chegue e entre. A ele cabe discernir.

Pedro entra no sepulcro, e atrás dele, João. As ligaduras e o sudário estão lá, cuidadosamente dobrados, sem o menor sinal de desleixo, roubo ou confusão. O que quer que se tenha passado ali dentro, passou-se em paz. E os dois amigos acreditam nas Palavras de Jesus.

Como Madalena, Pedro e João, também nós nos dirigimos ao sepulcro na madrugada de Páscoa. Se na verdade vivemos a noite de quinta-feira santa e o dia de sexta-feira santa com o coração totalmente centrado em Jesus, então também estamos tomados de assombro perante este amor absurdo que Deus nos tem, ao ponto de Se deixar matar, e matar numa cruz. Entramos na igreja como os discípulos entraram no túmulo vazio, e de repente, tudo faz sentido: Ele está vivo! Aqui já não cheira a morte mas a vida, e vida em abundância! Demoramo-nos a contemplar a palavra “ressuscitou” com a surpresa das primeiras testemunhas, como pergunta a sequência pascal: “Diz-nos, Maria: Que viste no caminho?” Porque não convém, à força do hábito, banalizar tão grande novidade. A vida triunfou da morte! O sepulcro não pôde conter a potência do amor que ali Se escondeu! O jejum de aleluias da quaresma conduz-nos ao júbilo triunfante desta manhã de Páscoa. Este é, verdadeiramente, o dia que o Senhor fez, e é preciso exultar e cantar de alegria, aceitando o convite do salmo.

Durante cinquenta dias, iremos saborear a alegria da ressurreição com a intensidade do primeiro encontro. Durante cinquenta dias, iremos encontrar o Ressuscitado no caminho de Emaús, à beira-mar, dentro de uma casa fechada, no cimo de um monte, na estrada de Damasco – e aceitando o desafio, iremos encontrar o Ressuscitado na doença, na perseguição, no trabalho, nos problemas de cada dia e nos problemas do mundo inteiro. Nada nos poderá tirar a alegria. Temos cinquenta dias de treino intensivo da felicidade!

Mas podemos alegrar-nos quando a vida nos corre mal e o mundo caminha para o abismo? Podemos cantar a caminho da arena, como os primeiros mártires, como os mártires de hoje? Qual o segredo?

O segredo é-nos dito por Paulo: “Porque vós morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus.” Só pode viver na alegria da Páscoa quem, como Jesus, passou pela sexta-feira santa e entregou a vida por amor. E isto, todos os dias. É preciso renunciar à nossa vontade para fazer a do outro; calar os nossos desejos para realizar os do cônjuge; fazer silêncio perante uma crítica; desligar o televisor para atender quem precisa. Quando S. Paulo diz “morrer”, ele quer dizer isso mesmo, “morrer”. A morte é sempre difícil, especialmente a morte do nosso “eu”. Alegremo-nos, em vez de nos lamentarmos, quando os outros ou os acontecimentos dão uma ajuda e nos “matam” mais um bocadinho! Pois como explica ainda S. Paulo: “Quando Cristo, que é a vossa vida, Se manifestar, então também vós vos haveis de manifestar com Ele na glória.” E esta certeza basta para encher a vida de esperança.

Vivamos então cada dia “afeiçoados às coisas do alto e não às da terra”. Sabemos que, aconteça o que acontecer, a nossa pátria é o Céu que Jesus nos abriu, e que tudo o que vivermos aqui, bom ou mau, só tem valor se nos ajudar a chegar lá. Somos emigrantes trabalhando em terra estrangeira e enviando para a pátria, mês após mês, o “dinheiro” necessário para construir aí a casa dos nossos sonhos…

Entramos na igreja como no sepulcro vazio. Pouco a pouco, o coração vai sintonizando com Jesus, rendendo-se ao amor vencedor. De Palavra em Palavra, de hino em hino, ao ritmo de aleluias, os olhos e os ouvidos vão-se abrindo.

De pé diante da multidão, um Pedro renovado fala de Jesus sem medo: “Deus ressuscitou-O ao terceiro dia e permitiu-Lhe manifestar-Se, não a todo o povo, mas a nós que comemos e bebemos com Ele…” De olhos e ouvidos abertos, contemplamos Jesus, Corpo e Sangue entregues até ao fim, e agora tornados Pão da Vida e Vinho de Salvação. Que bênção a nossa, que todos os domingos comemos e bebemos com Ele! A Eucaristia é verdadeiramente a nossa festa e o domingo o nosso dia. Comendo e bebendo com o Ressuscitado, também nós O vemos. E, vendo-O, aprendemos, como Pedro, a dar a vida por Ele, que primeiro deu a vida por nós…

Aleluia! Aleluia!

4 Comments

  1. Susana Mateus

    Obrigado pelas suas palavras que explicam tudo tão bem e de forma tão simples.
    Também para mim esta noite é a maior de todas, a mais importante, a que dá sentido á minha fé, à minha vida. Onde o passado, o presente e o futuro da Fé Cristã se justificam.
    Iremos em família à celebração desta noite porque quero que os meus filhos sintam, entendam e vivam a alegria desta noite [ mesmo que adormeçam a meio 😉]
    Uma Santa Páscoa para todos.

    • Um grande abraço, Susana e família! Lembramo-vos com saudades! E esperamos reencontrar-nos em breve, num próximo retiro ou aqui no canto de Caná, num dia de passeio familiar. Por que não? Cantemos juntos Aleluias ao Ressuscitado! Teresa

  2. Ricardo Correia

    Pena que não seja assim para todos. Cada vez há mais gente a afastar -se da fé e a mergulhar no pecado (abismo). Dá-se mais valor a fé no Advento e na Quaresma, mas para mim, havia de ser assim, no dia-a-dia e durante todo o ano. Eu pessoalmente nunca foi a favor do fanatismo na religião, mas acho que seguir-la e sobretudo seguir o exemplo de Jesus Cristo, faz-nos crescer na fé e como ser humano. Para mim a religião, não é só história e que se ouve quando se vai a missa, é também um modo de vida. A Quaresma, a Páscoa e Jesus Cristo deveriam ser exemplos para todos os cristãos, mas o que eu vejo são pessoas, completamente mergulhados e dominados pelas redes sociais, telemóveis e tantas outras coisas que as afastam da fé. Aquilo que eu acho é que pessoas como eu e como a sua família, deveriam ser mais missionárias e levar a fé e o caminho da santidade, a quem já se perdeu nela. Para terminar, queria desejar uma Santa Páscoa para todos e que toda gente possa abrir a porta e o seu coração, para a receber o compasso em suas casas e nas suas vidas.

    • As Famílias de Caná são famílias missionárias por natureza, Ricardo. E que grande alegria encontramos na missão! Aqui no site, na barra lateral, encontra a nossa Carta Fundacional, onde descrevemos esta nossa ânsia de levar Jesus às periferias. Uma santa Páscoa para si e para os seus!

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