Em Caná da Galileia...


Domingo IV do Tempo Comum, Ano B

O semanário diocesano Correio do Vouga pediu-me para assumir a reflexão semanal sobre as leituras de domingo. Decidi aceitar. Autorizam-me a publicação, neste site, do mesmo texto, depois da sua publicação no jornal. Assim, a partir de hoje, todas as sextas-feiras terão aqui a minha partilha sobre as leituras a serem proclamadas no domingo seguinte. Espero que vos ajude tanto a vós, lendo, como a mim, escrevendo! Aqui fica a primeira:

ESTÁ NA HORA DE LEVAR A SÉRIO A NOSSA VOCAÇÃO DE PROFETA

O Deuteronómio é, por excelência, o livro de Moisés. Nele, Moisés fala ao povo, abençoando, animando, relembrando as maravilhas do Senhor, e levantando a ponta do véu que cobre a sua intimidade com Deus. De facto, Moisés “falava com o Senhor face a face” (Deut 34, 10), “como um amigo com o seu amigo” (Ex 33, 11). Meditar nas belas passagens do Deuteronómio é visitar por instantes aquela intimidade especial que Deus e Moisés partilhavam. Quando nos colocamos no lugar de Moisés, fazendo a nossa oração pelas páginas do Deuteronómio, descobrimos que também nós e o Senhor nos podemos tornar amigos íntimos.

“O Senhor teu Deus fará surgir no meio de ti, de entre os teus irmãos, um profeta como eu”, diz Moisés. E se esse profeta formos nós? Pelo batismo, fomos todos igualmente ungidos profetas. Está na hora de levar a sério a nossa vocação.

“Se um profeta tiver a ousadia de dizer em meu nome o que não lhe mandei, ou de falar em nome de outros deuses, tal profeta morrerá.” Anunciamos com a palavra e a vida as Palavras do Senhor? Ou proclamamos opiniões pessoais, desvinculadas do magistério da Igreja? Falamos e vivemos em nome de Deus? Ou serão outros os deuses a fazer-nos agir e falar, como o deus-dinheiro, o deus-poder, o deus-fama?

Se somos chamados a ser profetas, também somos chamados a escutar os profetas que o Senhor nos dá em cada tempo. Profetas surgidos de entre os irmãos, como Moisés. “Se alguém não escutar as palavras que esse profeta disser em meu nome, Eu próprio lhe pedirei contas.” Escutamos o grande profeta que o Senhor fez surgir entre nós, o Papa Francisco? Acompanhamo-lo com a oração?

Entre estes grandes profetas, encontramos Paulo, outro apaixonado de Deus. A partir do momento em que Cristo o alcançou, nada mais interessou a Paulo senão alcançar também ele a Cristo (cf. Fl 3, 12). Às coisas do mundo, Paulo chamava de lixo (cf. Fl 3, 8), quando as comparava com o Reino. Nesta liberdade interior, Paulo vivia apenas para Deus. Assim, aos coríntios, Paulo aconselha o celibato, por permitir total dedicação ao Senhor. Se fomos chamados à vida consagrada ou ao sacerdócio, alegremo-nos com Paulo! Rezemos para que os jovens não fechem os corações se hoje ouvirem a voz do Senhor, como nos aconselha o salmo, antes se entreguem sem reservas, profetas dos nossos tempos, para “se preocupar apenas com as coisas do Senhor.”

Se, ao contrário de Paulo, somos casados, escutemos os seus conselhos como um desafio a não deixar os afazeres do mundo separar-nos do Senhor. Todos, casados ou solteiros, somos chamados à intimidade com Deus. Ao longo dos séculos foram vários os santos, começando por Maria e José, a mostrar-nos a excelência do caminho de santidade que é o matrimónio. São profetas que é preciso escutar! Como eles, como Paulo, não deixemos que nada nos distraia do essencial.

E à medida que nos tornamos íntimos do Senhor, à medida que nos deixamos maravilhar pela sua doutrina, como faziam as multidões com Jesus, a sua Palavra vai descendo dos ouvidos ao coração, percorrendo cada recanto da alma e da vida, lavando cada pecado, sarando cada ferida. Pouco a pouco, a Palavra vai levantando pedras, remexendo a lama, iluminando os esconderijos poeirentos do nosso castelo interior. Confrontando a nossa vida com a de Jesus, o verdadeiro Profeta anunciado por Moisés, descobrimo-nos profundamente miseráveis, cheios de “espíritos impuros”; e quanto mais miseráveis, mais merecedores da misericórdia do Senhor, como tão bem explicou o Santo Padre na Carta Apostólica Misericordia et Misera.

Neste domingo, ao escutar o Evangelho, não fechemos os nossos corações! Quando ouvirmos os gritos do possesso de Cafarnaum, recolhamo-nos dentro de nós, lá onde nascem as impurezas (cf. Mc 7, 15), e supliquemos a Jesus que nos purifique também. Voltemos a casa decididos a só cuidar dos interesses do Senhor, como Paulo. Que através do nosso testemunho profético, “todos fiquem admirados” com Jesus e “a sua fama se divulgue por toda a parte”. Ámen!

2 Comments

  1. Olá Teresa, que lindo!
    Que todos que leem este post, abram os seus corações, para que a Luz do Céu entre.
    Bem haja

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