Em Caná da Galileia...


Domingo V de Páscoa, ano B

Reflexão semanal, escrita pela Teresa, sobre as leituras do domingo seguinte, publicada no jornal diocesano Correio do Vouga

SOMOS CHAMADOS A DAR FRUTO, NÃO SOMBRA

“Eu sou a verdadeira vide e o meu Pai é o agricultor.” A imagem da videira atravessa toda a Bíblia. Com que carinho o Senhor foi cuidando da sua “vinha”, sempre à espera que desse bons frutos! Mas a vinha de Israel desiludiu o Senhor. E foi então que Deus decidiu plantar uma nova “videira”, a única verdadeiramente fecunda: Jesus.

No nosso jardim, aqui no coração da Bairrada, temos uma videira. No verão cobre-se de folhas grandes e dá muita sombra, pois foi para isso que a plantámos. Em contrapartida, não dá fruto, ou se o dá, é pequeno e amargo. Não podemos ter as duas coisas, dizem-nos os agricultores amigos: ou temos uma videira sem poda, coberta de folhas, crescendo para onde lhe apetece, ou temos uma videira bem podada, coberta de frutos. Fizemos a nossa escolha.

“Eu sou a Videira, vós sois os ramos.” Os cristãos não são chamados a dar sombra, mas fruto. A poda não é agradável. Há tanto para limpar e extirpar! Mas é absolutamente essencial. Quando, na vida, formos presenteados com alguma forma de dor, alguma humilhação, alguma desilusão, algum imprevisto desagradável, elevemos a Deus uma oração de gratidão: é a tesoura da poda a trabalhar!

“Eu sou a Videira, vós sois os ramos.” Nunca daremos fruto se não permanecermos unidos à Videira. É preciso que a seiva circule! Não basta um breve entusiasmo, uma oração apressada, a missa dominical. Sim, é preciso comungar muitas vezes, para receber dentro de nós esta Seiva Viva que tudo alimenta e faz crescer. Mas depois é preciso permanecer em Jesus. Isto requer da nossa parte uma atenção contínua. E nós andamos tão distraídos! Quantas vezes nos religamos à Videira durante o dia? Quantas vezes elevamos para Deus o pensamento, em breves orações de súplica ou louvor? Será que o fazemos com mais frequência do que consultamos o telemóvel? É preciso aprender a fazer tudo “a meias” com Jesus: “Nós, Jesus: Tu e eu!” É preciso meditar todos os dias na sua Palavra. “Porque sem Mim, nada podeis fazer”.

E se esta Seiva Viva circula em nós, então damos muito fruto, diz-nos Jesus. Na sua Carta, João explica-nos em que consiste este fruto: “Não amemos com palavras, mas com obras.” De facto, se a “seiva” de Jesus é o seu amor, então os frutos nascidos desta “árvore” só podem ser gestos de amor. Na Exortação Apostólica Alegrai-vos e Exultai, o Papa diz-nos: “O melhor modo para discernir se o nosso caminho de oração é autêntico será ver em que medida a nossa vida se vai transformando à luz da misericórdia.” (Nº 105) E ainda: “Quem deseja verdadeiramente dar glória a Deus com a sua vida (…) é chamado a obstinar-se, gastar-se e cansar-se procurando viver as obras de misericórdia.” (Nº 107) As obras de misericórdia, eis os frutos da oração e da comunhão! Não as obras de misericórdia quando calha, mas as obras de misericórdia até dar a vida, como Jesus. Enquanto não nos gastarmos – palavra do Papa – na prática das boas obras, não damos fruto.

Quem ama o irmão nada tem a temer diante de Deus, diz-nos João. Ainda que a memória nos acuse de escolhas erradas ou defeitos de caráter, nada disso é suficiente para nos afastar de Deus, enquanto praticarmos obras de amor. De facto, “quem observa os seus mandamentos permanece em Deus e Deus nele.”

Ser cristão é, portanto, ser um ramo ligado à Videira e, pela Seiva que circula em toda a Videira, ligado a todos os outros ramos que dela brotam. Ninguém é cristão sozinho, pelo que a expressão usada por alguns crentes de “contacto direto com Deus” sem a mediação da comunidade cristã, não faz sentido.

Paulo sabia-o bem: depois de Jesus Se lhe revelar na estrada de Damasco, partiu ao encontro dos irmãos. O Livro dos Atos diz-nos que não foi fácil esta aproximação, “por não acreditarem que fosse discípulo”. Se na época de Paulo era difícil para uma pessoa refazer a vida depois de um passado sujo, mais o é agora, em que as redes sociais fazem História de todos os passos que damos! É preciso imitar Barnabé, que tudo fez para reabilitar Paulo na opinião pública: “Barnabé tomou-o consigo e levou-o aos Apóstolos”. E logo toda a comunidade abriu o coração a Paulo. Ah, quantas lições de verdadeiras obras de misericórdia neste pequeno texto, e quanto a aprender e a praticar nas nossas comunidades cristãs! “Eu vos louvo, Senhor, no meio da multidão”, canta o salmo. Porque é no meio dos irmãos que o Senhor quer ser louvado.

Domingo de manhã, hora da missa. Não podemos viver sem esta hora. Para ela converge toda a nossa semana e dela nascem todos os nossos gestos de amor. Vimos religar-nos à Videira, beber da sua Seiva Viva, para darmos fruto. E trazemos a família, os “raminhos” pequenos que brotam do nosso “ramo”, para que também eles frutifiquem. Somos responsáveis por eles, pois dependem de nós para vir e beber desta “seiva”. É, de facto, um dos principais deveres dos pais cristãos, trazer os filhos à Eucaristia e prepará-los para receberem a Sagrada Comunhão… As obras de misericórdia começam em casa. Aleluia!

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