Em Caná da Galileia...


Domingo XVII do Tempo Comum, ano C

Reflexão semanal, escrita pela Teresa, sobre as leituras da missa do domingo seguinte, publicada no jornal diocesano Correio do Vouga

CONVERSANDO COM DEUS

Hoje, a Palavra conduz-nos ao cerne da oração de Abraão e da oração de Jesus. Entre uma e outra, por onde anda a nossa?

“O clamor contra Sodoma e Gomorra é tão forte, o seu pecado é tão grave que Eu vou descer”, diz Deus, nos inícios da História da Salvação. É tão próximo, o Deus de Abraão, este Deus que ouve e que vê, que se compadece, que Se põe a caminho connosco! Quatro mil anos depois de Abraão, dois mil anos depois de Jesus, ainda nos queixamos de que Deus não vê nem ouve o que se passa no mundo, e que não reage às nossas orações…

Abraão e Deus caminham lado a lado, e vão conversando como bons amigos. É a mesma amizade que, mais tarde, a Bíblia exaltará ao falar de Moisés, que “falava com Deus como um amigo com o seu amigo” (Ex 33, 11), e que culminará na oração de Jesus. Nesta conversa durante o caminho, Abraão vai ganhando confiança com o Senhor, aprendendo a conhecer o seu pensamento, sem nunca perder o respeito e o temor: “Atrevo-me a falar ao meu Senhor, eu que não passo de pó e cinza”; “Se o meu Senhor não levar a mal, falarei mais uma vez…” A amizade e o respeito não se excluem, pelo contrário. Quanto mais nos aproximamos do Senhor, crescendo em intimidade, mais nos damos conta da sua santidade. Por isso, os nossos gestos reverentes durante a missa e a adoração testemunham a profundidade do nosso amor.

Em Jesus, este Deus que ouve e que vê, que Se compadece e que caminha connosco, tem um nome: “Pai”. Que novidade magnífica: Deus é nosso Pai! Esta notícia devia, por si só, ser suficiente para transformar a nossa vida, enchendo-nos de confiança, alegria e paz. “Se um de vós for pai e um filho lhe pedir peixe, em vez de peixe dar-lhe-á uma serpente?” Mas quantos de nós tratamos realmente o Senhor por Pai? Quantos de nós O convidamos para companheiro de jornada, conversando com Ele o dia inteiro, como Abraão e Jesus?

Lado a lado, Deus e Abraão falam de Sodoma e de Gomorra. Alguns versículos antes, o Senhor pensa em voz alta: “Ocultarei a Abraão o que vou fazer?” (Gn 18, 17) Quando rezamos, não partilhamos apenas com Deus as nossas preocupações; deixamos que também o Senhor partilhe connosco as suas. Não somos apenas nós a repousar no seu Coração, antes Lhe oferecemos o nosso, para que nele repouse. “Pai, venha o vosso reino”, reza Jesus. A primeira parte do Pai-Nosso, tal como o rezamos em Igreja, não se centra em nós, mas na vontade de Deus, no Reino de Deus, nos sonhos de Deus, tal como a oração de Abraão. Os nossos pequenos problemas dissolvem-se neste grande plano de salvação do Senhor, que é nosso Pai, que nos quer irmãos uns dos outros, que nos quer ocupados e preocupados uns com os outros, que quer que rezemos uns pelos outros.

“Ireis destruir o justo com o pecador?” Pergunta Abraão, iniciando assim a primeira oração de intercessão da História Sagrada. Afinal, quanto vale um justo? Serão cinquenta justos suficientes para vencer a maldade de milhares de pecadores? E se forem quarenta e cinco? Ou talvez trinta, vinte, dez? Abraão regateia com Deus, mas Deus não oferece luta: “Se encontrar em Sodoma cinquenta justos, perdoarei a toda a cidade por causa deles.” “Em atenção a esses dez, não destruirei a cidade.” Parece-nos quase ver um sorriso maroto na boca do Senhor, como se tivesse sido Ele mesmo a provocar a intercessão de Abraão. “Quando vos invoco, sempre me atendeis, Senhor”, rezamos no salmo. “Pedi e dar-se-vos-á; procurai e encontrareis; batei à porta e abrir-se-vos-á”, dirá Jesus.

O clamor contra o nosso tempo é tão forte, o seu pecado tão grave… Podemos reler as Escrituras à luz da atualidade. Quantos justos haverá, capazes de conter a ira divina?  Cinquenta? Quarenta, trinta, dez? Serão os cristãos suficientemente santos para atrair as bênçãos do Céu? Em Fátima, o Anjo de Portugal disse aos pastorinhos: “Que fazeis? Orai, orai muito. Os Corações Santíssimos de Jesus e Maria têm sobre vós desígnios de misericórdia. Oferecei constantemente, ao Altíssimo, orações e sacrifícios. De tudo quanto puderdes, oferecei a Deus sacrifício em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e súplica pela conversão dos pecadores. Atraí assim, sobre a vossa pátria, a paz.” (Anjo de Portugal, 2ª aparição) A mesma mensagem do Génesis, ali na obscura serra de Aire!

Hora da missa. O clamor contra as Sodomas e as Gomorras de sempre é tão forte, o seu pecado tão grave, que Deus desceu… Ei-l’O aqui, sobre o altar, o Justo por excelência! “Deus perdoou-nos todas as nossas faltas.”, diz S. Paulo aos Colossenses. Sodoma não tinha dez justos, pois foi destruída, mas a História inteira tem agora um único Justo, Jesus. “Deus anulou o documento da nossa dívida (…) cravando-O na cruz”, explica S. Paulo. Como não havemos de ser alegres e de ter confiança? A nossa oração já foi atendida! Dentro de momentos, o Justo entrará no nosso coração, partilhará connosco os seus segredos, e unidos a Ele, por Ele justificados, também nós atrairemos, sobre os nossos irmãos, o perdão e a paz…

2 Comments

  1. Teresa, tenho uma pergunta a propósito, nao deste post em especial, mas da missa em si.
    Eu sou totalmente apologista de levar as criancas, TODAS as criancas, desde bebés recém-nascidos, à missa.
    Porque, se nao os habituarmos desde o princípio, como queremos que facam parte da comunidade católica?
    E como eu gosto de ir à missa em família, todos juntos, nao se poe a hipótese de o pai ficar em casa a tomar conta da bébé para a mae ir à missa com a irma de 9 anos…
    Ora a minha “bébé” de 16 meses é muito irrequieta e barulhenta… Eu bem lhe ponho a xuxa na boca, eu bem lhe dou bolachas, eu bem tento que fique sentada no carrinho…
    Nao senhora, ela é teimosa como a mae 😉 e tem de andar a correr pela igreja, “falando” em voz alta…
    Há duas semanas, na altura da comunhao, uma senhora idosa, ao regressar ao seu lugar, passou por mim e fez um comentário entre dentes do género “Falta de respeito…”. Eu respondi: “Desculpe?” mas ela nao disse mais nada.
    Ao fim da missa, estando nós a acender velas, voltou à carga, dizendo que era uma pouca vergonha as pessoas trazerem criancas barulhentas para a missa, onde incomodam os outros crentes. Eu respondi que a missa é para todos e que Jesus disse “Deixai vir a mim as criancinhas” e acrescentei que nao posso obrigar a miúda a estar quieta e calada, a nao ser que a ate e amordace. A velhota respondeu que há missas para as criancas. Eu respondi que Domingo às 11 horas é para mim uma hora ideal para famílias.
    O que eu quero dizer com isto é que fiquei triste e incomodada, estragou-me a missa…
    Gostava de saber a tua opiniao….

    • Querida Teresa, a “missa das crianças” não existe. Só existe a missa. Deus não tem netos, só tem filhos. A tua menina é tão filha de Deus como a senhora velhinha que se sentiu incomodada. Continua a levá-la à missa, porque o Pai quer a sua companhia. Bj!

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