Em Caná da Galileia...


Não passeis adiante

A primeira leitura da missa de hoje, domingo XVI do Tempo Comum, é uma das minhas passagens preferidas da vida de Abraão. Quantos ensinamentos neste curto episódio do nosso pai na fé! Encontramo-la em Gen 18, 1-10.

Abraão estava sentado à entrada da sua tenda, no maior calor do dia…

Ontem, a nossa família foi ao Ribatejo visitar a família Batista, que vive numa pequenina aldeia no meio de uma imensa planície, onde os campos de arroz se estendem até ao horizonte, os touros passeiam nos campos e as cegonhas fazem ninhos mesmo diante dos nossos olhos. O dia não podia ter sido mais feliz, nem o acolhimento mais completo.

Raposa 5

Raposa 2

A paisagem silenciosa e os quarenta e poucos graus que experimentávamos à flor da pele fizeram-me pensar em Abraão, sentado à entrada da sua tenda no maior calor do dia. E quando se está assim sentado, aguentando o calor e aproveitando um descanso merecido, temos a tentação de nos esquecermos de erguer os olhos… Não assim com Abraão:

Ergueu os olhos e viu três homens de pé diante dele. Logo que os viu, deixou a entrada da tenda e correu ao seu encontro; prostrou-se por terra e disse: «Meu Senhor, se agradei aos vossos olhos, não passeis adiante sem parar em casa do vosso servo.»

Quantas vezes o Senhor passa mesmo diante dos nossos olhos, e nós não os erguemos para O ver! Passa, sabemo-lo com toda a certeza, em cada um dos irmãos com quem nos cruzamos no dia, a começar pelos que vivem em nossa própria casa – e o tempo de férias é um dom que o Senhor nos faz para podermos contemplar com mais calma a sua presença na família e nos amigos. Passa em cada acontecimento, bom ou mau, que nos surpreende na vida. Passa pelos gestos rotineiros que repetimos quase sem neles pensar, passa pelos sucessos e pelos fracassos. Deus anda sempre muito perto de nós, e se levantarmos os olhos, encontraremos os Seus, que nos fitam com amor.

Foi no maior calor do dia que visitámos também a pequenina igreja onde a família Batista reza e celebra a Eucaristia. Que maravilha! Ajoelhados, cantámos e louvámos o Senhor, agradecendo o dom da amizade, o dom da vida, o dom das Famílias de Caná. E ali, naquele refúgio fresquinho onde Jesus, do sacrário, encheu de Água Viva as nossas bilhas, eu descobri uma outra Palavra dentro da história de Abraão…

igreja da Raposa

Não estará Jesus, no sacrário ou à hora da missa, sentado como Abraão à entrada da Tenda do seu Coração, de olhos erguidos a ver quem passa? Não correrá Ele ao nosso encontro, prostrando-Se por terra a nossos pés – ninguém Se humilha como Deus – e suplicando-nos: “Se agradei a teus olhos, não passes adiante sem parar em casa do teu servo…”? E a leitura continua, e mesmo sem o querer, não consigo deixar de a ler como proferida por um Deus que, por mim, morreu numa cruz:

Mandarei vir água, para que possais lavar os pés e descansar debaixo desta árvore. Vou buscar um bocado de pão, para restaurardes as forças antes de continuardes o vosso caminho, pois não foi em vão que passastes diante da casa do vosso servo.

Ah, Jesus que Se abaixa até ao chão e nos lava os pés como fez aos seus discípulos, Jesus que nos serve o Pão que Ele mesmo amassou, o Vinho feito com as uvas que Ele mesmo esmagou, Jesus que nos põe a mesa para que possamos descansar debaixo da Árvore da Cruz e nos oferece o céu para restaurar as nossas forças antes de continuarmos o caminho da vida! Pois não é nunca, nunca em vão que passamos diante da sua Casa.

Cruz e sacrário da igreja da Raposa

Como são poucos os que acolhem o convite! Dizia o Santo padre Pio que, se soubéssemos o que é a Eucaristia, precisaríamos da PSP todos os domingos às entradas das igrejas para organizar o trânsito…

Raposa 7

2 Comments

  1. Catarina Silva

    Saudades destes textos, que nos fazem pensar e ver com outros olhos….Obrigada!

  2. Rogėrio Ribeiro

    ” Felizes os convidados para a ceia do Senhor: Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. ”

    De facto, Jesus convida-nos para o seu banquete mas são poucos os que aceitam o seu convite!
    E no seu banquete è Ele mesmo o alimento… Jesus que nos ama ao ponto de se fazer tão pequenino ao permanecer daquela forma tão simples e humilde num bocadinho de pão!

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