Em Caná da Galileia...


O divórcio: norma ou exceção?

Num destes dias, a procurar notícias do mundo no meu telemóvel enquanto esperava por um filho no carro, deparei-me com um artigo confuso. Era um artigo sobre o recente divórcio de duas figuras conhecidas no nosso país, embora eu não faça ideia de quem são. O que me chamou a atenção foi a forma como o divórcio vinha anunciado. O texto abundava em expressões como “este (o divórcio) é um caminho que construímos juntos”, “ficará para sempre a família que formámos”, bem como em imagens de rostos felizes e divertidos.

Li uma segunda vez, não fosse eu não estar a entender. Tratava-se de um anúncio de um divórcio ou de um casamento? Porque falar em construção, em caminho percorrido e em família feliz não rima propriamente com divórcio! Um divórcio não é algo que se constrói juntos, mas algo que se destrói juntos. O resultado também não é, de todo, uma família feliz, aliás, porque esta família foi destruída na sua essência. O resultado é sempre uma família infeliz. O que não significa que, mais tarde, não seja possível a felicidade, o crescimento harmonioso dos filhos, a reconstrução das vidas que assim foram feridas. Quando Deus está connosco, o mal nunca tem a última palavra, nem ninguém fica condenado à infelicidade! Mas daí a falarmos do divórcio em termos de tal maneira positivos, que se tornam atraentes, vai uma grande distância.

Escrevo hoje aqui sobre este tema porque me parece que um dos maiores perigos que nós, cristãos, corremos é precisamente o de nos adaptarmos à palavra do mundo, aceitando-a com normalidade, deixando de nos sentir inquietados pela Palavra de Deus. Em qualquer canal de notícias de qualquer parte do mundo, neste momento os temas relacionados com a destruição das famílias – divórcio, aborto e afins – são tratados como frutos positivos da emancipação da mulher e da evolução natural das sociedades e como sinal identificativo do primeiro mundo. O divórcio e as famílias de recasados são apresentados como a norma em qualquer telenovela ou filme. Casar e “descasar” tornou-se de tal forma banal, que no nosso país há audiências televisivas que justifiquem um concurso do estilo “reality show” em que se brinca aos casamentos com casamentos civis que se realizam a sério.

Estamos a chegar ao ponto mais perigoso que podíamos chegar, no entendimento do que é a família: a normalização do que devia ser sempre uma exceção à regra; a aceitação como um sucesso do que é um fracasso. A Palavra de Deus é clara:

Ai dos que chamam mal ao bem e bem ao mal, que fazem das trevas, luz, e das luz, trevas, que chamam doce ao amargo e amargo ao doce! (Is 5, 20)

Vamos devolver ao casamento a dignidade que ele merece, mesmo antes de ser sacramento. Vamos olhar para uma sociedade que banaliza o divórcio como uma sociedade com problemas, uma sociedade fracassada, que precisa urgentemente de cura. Vamos chamar as coisas pelos nomes, com linguagem simples e clara, porque a misericórdia de Deus acontece quando o seu Coração Se debruça sobre a nossa miséria; e se não há miséria – ou se não há consciência de miséria – não há misericórdia possível.

Já leram o Ensinamento Mensal? Sejamos testemunhas luminosas deste “grande mistério” que é o amor humano, espelho do amor divino…

 

 

 

 

6 Comments

  1. Ai Teresa… como estou cansada desta sementeira de enganos!
    Isto de começar por anunciar o fim de uma etapa, a remediação da relação que acabou, como o do início do processo em si mesmo, não é senão um triste equívoco…
    Ainda hoje vinha a reflectir sobre o fim das famílias, enquanto cerne essencial da sociedade, para as trocar por amigos que se elegem enquanto família, o que em todos os casos com que me cruzo se traduz em solidão…
    Que Deus nos valha… lembro o pecado original, quando parece que tudo está equilibrado eis que…

  2. A Teresa há tempos escreveu: Ser cristão nunca foi, nem nunca será, “normal”. Não nos enganemos a nós próprios, deixando-nos levar pelo que todos fazem, todos dizem, todos acreditam. Ser cristão é sempre e em toda a parte ser sinal de contradição; ou, como diria S. Paulo, “loucura”.
    Tambem me recuso a acreditar e a chamar-lhe: normal!
    “A batalha final entre o Senhor e o reino de Satanás será sobre o matrimónio e a família” dizia a Irmã Lúcia!
    E ponho-me a refletir: quantos divórcios não seriam primeiro que tudo matrimónios nulos? Há tanta ignorância, tanta falta de preparação para um sacramento tão grande e tão belo!

    • Transcrito do ensinamento mensal:
      “Escrevendo sobre a grandeza deste sacramento a partir da teologia de Paulo, o Venerável
      Arcebispo Fulton Sheen imaginou este diálogo entre a Igreja e os noivos:
      “Diante do altar, a Igreja pergunta aos noivos: «Que garantias dais de que vos ireis amar até
      que a morte vos separe?» Se eles disserem: «Damos a nossa palavra», a Igreja responderá: «As
      palavras e os pactos podem ser quebrados, como a história do mundo prova.» Se eles disserem:
      «Damo-nos um ao outro um anel», a Igreja responderá: «Os anéis podem perder-se, e com eles
      a memória da promessa. Só quando vocês comprometerem a vossa própria salvação eterna como
      garantia da vossa fidelidade em representarem a união de Cristo com a Igreja é que a Igreja
      consentirá em vos unir como marido e mulher.»” (Three to Get Married, tradução livre)”

      Para quando esta honestidade na Igreja? Para quando esta coragem dos sacerdotes falarem primordialmente de salvação, santidade e céu?
      Quanto aos que se vão casando e descansando sem noção e, apesar do desleixo da Igreja na sua salvação, há que autonomamente procurar respostas e estar bem informado, porque ninguém questiona as contrapartidas do incomprimento da lei mesmo quando o autor do delito desconhecia a “regra”.

      Volto ao que interessa mesmo, repito: há que falar mais de salvação do que de felicidade, mais de santidade do que de entrega total ao outro. Refiro-me às palavras e ao conteúdo que tendem sempre e, cada vez mais, a serem mais simpáticos e atraentes do que puros e transparentes.

  3. Pilar Pereira

    A citação que fazes de Isaías é 100% certeira: hoje em dia há muito disso, de chamar bem ao que é mal e mal ao que é bem, etc.. É suposto, na nossa sociedade, tudo ser permitido, tudo ser normal, desde que se queira e “não se prejudique ninguém” (em teoria, porque na prática, com tantos exemplos confusos e desviados, muito boa gente fica prejudicada na sua consciência…).

  4. Apesar da preparação e de ter casado para a vida toda, pronta para enfrentar os desafios, cá estou eu divorciada e mãe de uma filha . Não foi uma decisão minha e passados tantos anos, ainda sinto que foi um fracasso e uma dor profunda que não só me avassalou a mim, mas também à família próxima. Por isso, também não entendo como se utiliza a palavra “construção”, quando todo o processo é uma grande destruição .

  5. Susana Machado

    Boa tarde Teresa,

    Este texto devia ser lido não só por quem segue esta Página, mas sim por todas as pessoas, para que o possam meditar e refletir, pois é isso que está a faltar à nossa sociedade dita moderna!!

    Obrigada pela partilha.

    Susana

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