Aqui estamos

“Aquele que envia a luz e ela parte, que a chama de volta a ela, tremendo, obedece. Brilham em seus
postos as estrelas, palpitantes de alegria: ele as chama e elas respondem: ‘Aqui estamos!’ Cintilando com
alegria para aquele que as fez.” Baruc 3, 33-35

O regresso à rotina

Setembro marca o regresso à rotina depois das férias. As famílias com filhos pequenos não têm dúvidas:
setembro é o começo do novo ano. De qualquer forma, nenhuma família consegue escapar à sensação de
novidade e de regresso que paira no ar fresco do início de outono. As férias já lá vão. Aqui estamos!

Aquele que envia a luz e ela parte

É Deus, sempre, que nos envia e nos manda regressar, que nos prepara as férias e de novo o trabalho.
Estamos nas suas mãos. Dependemos totalmente d’Ele. Nós, e todas as suas criaturas, até as estrelas. Se
emanamos alguma luz, é que porque Ele assim o quis. Nada vem de nós apenas. Tudo Lhe pertence.

Brilham em seus postos as estrelas

Cada pequena estrela que brilha no céu cumpre a sua missão. Cada uma delas tem um posto. A cada manhã
e a cada tarde, Deus faz a chamada, e todas as estrelas respondem: Aqui estamos!
Cada um de nós tem um posto, onde Deus nos colocou para iluminar em redor. Não nos é pedido que
iluminemos todo o céu, mas apenas um pedaço minúsculo do Universo. Somos certamente estrelinhas
pequenas, mas é com alegria que respondemos à chamada de Deus a cada dia: aqui estamos! Aqui, no nosso
posto, na nossa casa, no nosso bairro, na nossa paróquia, na nossa família. Estamos onde devemos estar.
Quantas vezes temos a sensação de que brilhamos pouco, ou que não iluminamos ninguém? Quantas vezes
nos sentimos invisíveis, pouco reconhecidos, pouco acarinhados? Quantas vezes nos cansamos do trabalho
rotineiro e pouco vistoso? As estrelas, diz-nos o profeta, brilham “para Aquele que as fez” e mais ninguém.
Se cumprem uma missão, é porque Deus lha confiou, e mais ninguém. Andamos muito enganados, se
queremos ser reconhecidos pelos homens, se queremos recompensas aqui e agora. Brilhemos, sim, mas para
Aquele que nos fez, com pureza de intenção. Como é difícil alcançar esta pureza!

Palpitantes de alegria

Mais difícil ainda é manter a alegria no nosso posto, o ano inteiro, todos os dias. Imitemos as estrelas que o
profeta descreve! A cada chamada de Deus, respondamos com alegria. Eis o grande desafio! Um filho
interrompe a nossa leitura ou o nosso sono? Respondamos com alegria. O chefe critica o nosso trabalho?
Respondamos com alegria. A chuva enche de lama a casa e o carro e atrapalha-nos os planos? Respondamos
com alegria. É preciso cozinhar outra vez, ainda há duas horas acabámos de lavar a louça da refeição
anterior? Respondamos com alegria. Aqui estamos!

Cintilar

A luz das estrelas demora vários anos, séculos ou milénios a chegar até nós, dependendo da sua distância. E
mesmo depois de morrerem, a luz continua a viajar. Assim, quando olhamos para a Estrela Polar, por
exemplo, estamos a olhar para um brilho de há cerca de 400 anos. O brilho que ela emite hoje, irá iluminar a
Terra dentro de outros 400 anos.
Assim também, a vida dos nossos antepassados continua a iluminar as nossas vidas hoje, nos mais variados
campos, da arte à ciência, da política à vida doméstica, da religião à literatura. Teria Camões alguma vez
imaginado que os seus poemas iriam inspirar gerações e dar tantas dores de cabeça a estudantes no século
XXI? E a pequena Maria Goretti, ignorante e miserável, alguma vez sonharia que a sua vida seria luz para
cristãos do mundo inteiro? O que diria o padre Vianney, desterrado para Ars, no fim do mundo, por ser
considerado pouco inteligente, ao descobrir-se padroeiro dos sacerdotes? E o que pensariam os habitantes
das cavernas, se lhes contássemos até onde a descoberta do fogo levou a Humanidade? Pequenos passos,
pequenas descobertas, pequenos trabalhos, pequenas rotinas – e o Universo nunca mais é igual.
Os objetos básicos numa geração são, gerações depois, obras de arte. Não é preciso ir muito longe: há uns
dias, recebemos como presente de um amigo já velhinho, alguns discos de música clássica da sua coleção.
Acontece que não temos gira-discos para os escutar… Quantos gira-discos eu vi ao longo da vida! Nunca
lhes liguei importância, sempre achei que faziam parte da mobília normal de qualquer casa – até precisar de
um. Também as nossas ações quotidianas e rotineiras, a forma como educamos os filhos e nos relacionamos
com o esposo, as nossas receitas culinárias, os livros que lemos e as canções que cantamos ao conduzir ou
estender roupa – tudo isso irá iluminar as gerações futuras durante vários séculos, e por toda a eternidade. Se
no futuro, tudo isso terá um imenso valor histórico ou artístico, porque não lho podemos dar já hoje?

Aqui estamos!

Não há nada banal na nossa vida: tudo é impressionante, belo, artístico, divino – se lhe dedicarmos tempo e
atenção. Da próxima vez que formos tentados a abandonar o nosso posto e a desprezar a rotina dos nossos
dias, pensemos nas estrelas, no seu brilho cintilante e na alegria com que respondem à chamada de Deus, e
digamos como elas: “Aqui estamos!” Ámen. Um feliz regresso às rotinas para todas as famílias!