Em Caná da Galileia...


Domingo X do Tempo Comum ano B

Reflexão semanal, escrita pela Teresa, sobre as leituras da missa do domingo seguinte, publicada no jornal diocesano Correio do Vouga

QUE GRANDE CONFUSÃO!

Os textos deste domingo transportam-nos para o meio da tempestade causada pelo pecado. Da Primeira Leitura ao Evangelho, não temos como fugir a esta visão aterradora do mal que todos causamos e que todos sofremos, e que mais nos faz gritar por um Salvador a partir “do profundo abismo” em que vivemos.

Adão e Eva. Como terá sido o episódio que levou a esta bela alegoria? Não sabemos. Mas com ou sem árvores de fruto e serpentes falantes, o dogma do pecado original é dos mais fáceis de constatar, bastando olhar à volta em qualquer época da história humana. Todos somos vítimas de pecados que não cometemos, e todos causamos dor aos outros com os nossos pecados. O Génesis traz-nos duas perguntas de Deus, e embora as situe nos inícios da História, elas são para nós hoje também.

“Onde estás?” Pergunta Deus a Adão, procurando-o no jardim depois do pecado. “Onde estás?” Pergunta Deus a cada um de nós, procurando-nos no nosso jardim interior, aí onde todos somos capazes de escutar a sua voz misteriosa. Mas nem sempre aí estamos. Cada vez com mais frequência, preferimos refugiar-nos no ruído dos nossos auscultadores, da televisão sempre ligada, dos centros comerciais, a fazer o silêncio necessário para que Deus nos encontre. Por isso são tão necessários os tempos de retiro, especialmente o retiro semanal chamado Domingo, em que na Eucaristia e no contacto com a Criação aprendemos a reconhecer a voz que nunca deixa de nos chamar.

“Que fizeste?” Continua o Senhor. “Que fizeste?” Pergunta-nos também. E nós, como Eva, encontramos mil desculpas para o nosso pecado, apontando os outros, as circunstâncias, a vida, todos menos a nossa liberdade. Como é importante rezarmos o Confiteor – “Por minha culpa, minha tão grande culpa” – batendo com a mão no peito e inclinando a cabeça! Só assumindo o nosso pecado encontramos a abundante redenção que canta o salmo, pois só quem se descobre no abismo profundo pode estender a mão para ser resgatado.

E este mesmo ambiente de pecado atravessa o Evangelho de hoje. Que grande confusão! Jesus está em casa, e com Ele, uma imensa multidão, desejosa de O tocar e escutar, de ser por Ele tocada e curada das suas feridas e dores. Imaginemos a casa de Jesus, as portas e as janelas escancaradas por não ser sequer possível fechá-las, tal a pressão da multidão para nela entrar.

Como está hoje a casa de Jesus? Olhemos em volta na igreja, durante a missa dominical. Quantos vieram para O tocar? As portas estão escancaradas, e o Papa Francisco não cessa de abrir janelas. Onde está a multidão?

Do lado de fora da casa, sem nela entrar, estão os familiares de Jesus, que vieram para O repreender e O levar de volta a Nazaré. Ouviram dizer que estava louco, embora não O tenham acompanhado na missão nem escutado as suas palavras ou presenciado os seus milagres. E porque ouviram dizer, concluíram que era verdade. Não é assim hoje também? Quantos ficam à porta, sem entrar na Igreja, mas do lado de fora não cessam de comentar a loucura dos que estão “dentro”? Quantas mentiras sobre afirmações do Santo Padre e quantas invenções de doutrinas que nunca existiram são todos os dias veiculadas pelos meios de comunicação social, minando a confiança dos simples na Igreja? São as chamadas “fake news”, de que tanto fala o Papa.

Maria também lá está. Imagino que tenha acompanhado os seus familiares para poder servir de mediadora, impedir uma atitude intempestiva, proteger Jesus dos seus. Veio como elemento de união, procurando que a casa não ficasse dividida contra si própria, como Jesus explicava. Assim continua hoje a Mãe, visitando a Terra e os corações para mediar a paz e acalmar os ânimos, e a todos reconduzir ao Senhor.

Jesus não Se perturba. E diante dos que O acusam, anuncia uma nova família, a família dos filhos de Deus, de todos os que procuram fazer a vontade do Senhor. Olhando em volta, para os que estão com Ele em casa, para os que O escutam e acolhem, proclama esta boa nova que nos deve encher de alegria: todos, sem exceção, podemos ser da sua família, se estivermos dispostos a fazer a sua vontade. Não foi assim que Maria  se tornou sua Mãe?

Quando vivermos apenas para fazer a vontade do Senhor, pondo em prática os seus ensinamentos, que nos importa tudo o que possamos sofrer nesta vida? Todos os sofrimentos juntos não passam de uma “ligeira aflição dum momento” quando comparados com a eternidade, diz-nos Paulo. O único verdadeiro mal, diz-nos Jesus no Evangelho e diz-nos o Génesis, é o pecado. O único verdadeiro bem é o amor. Tudo o resto é graça – nunca desgraça – pois tudo, absolutamente tudo, se acolhido com a atitude certa, nos pode preparar “um peso eterno de glória”.

Manhã de domingo. Vimos à Casa do Senhor. Somos da sua família e precisamos escutar a sua Palavra e deixarmo-nos tocar por Ele, para depois sermos capazes de cumprir a sua vontade. Vimos com ânsia, com verdadeira pressa, pois esperávamos por esta hora “mais do que as sentinelas pela aurora”, como cantaremos no salmo…

2 Comments

  1. Que bela homilia!

  2. Maria Alice Ribeiro

    Que bom entrar na Casa do Senhor e sair de coração quentinho porque o amor D’Ele aquece todos os que necessitam e evocam o Seu Nome. Que belo texto para ler e guardar na memória e no coração.

Responder a Maria Alice Ribeiro Cancelar resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *